Atividades musicais podem
ajudar no desenvolvimento cerebral, mas educadora ressalta que é preciso
respeitar os interesses da criança em cada fase.
O contato da criança com a música desde a primeira
infância pode ajudar em seu desenvolvimento cerebral. O que músicos e
educadores já percebem em seu dia a dia trabalhando com crianças agora faz
parte do resultado de uma pesquisa realizada na Universidade de Concórdia, no
Canadá. Segundo os dados, pessoas que começaram a estudar música antes dos 7
anos apresentam conexões neurais na idade adulta diferentes daquelas que
começaram seus estudos musicais mais tarde.
Para realizar a pesquisa, foram montados três grupos: um
com músicos profissionais que começaram a aprender antes dos 7 anos, músicos
profissionais que começaram a estudar música depois dos 7 anos e pessoas que
nunca haviam praticado um instrumento. Todos os participantes tiveram que
executar alguns movimentos com o corpo. Usando aparelhos específicos, os
pesquisadores mediram a resposta cerebral de cada um dos participantes durante
o exercício. O objetivo dos pesquisadores era descobrir se existia algum tipo
de conexão no cérebro que só poderia ser feita em determinada idade.
Ao analisar as habilidades motoras de cada grupo, eles
notaram que os adultos que haviam começado a estudar música mais cedo tinham
mais conexões entre as áreas motoras do lado esquerdo e do lado direito do
cérebro. Entre aqueles que não eram músicos profissionais e os músicos que
haviam começado seus estudos mais tarde, não havia diferença. Para os
especialistas, isso confirmou a hipótese inicial. Vale lembrar que o estudo não
estava avaliando a qualidade musical dos participantes, mas sim estudando sua
estrutura cerebral.
Para o neuropediatra Mauro Muszkat, da Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp), os resultados obtidos pela pesquisa fazem muito
sentido, pois o cérebro realmente tem os chamados “períodos sensíveis” e certas
conexões só podem ser construídas nesses momentos. Isso acontece em relação não
só com habilidades motoras, mas com a linguagem, audição e visão.
De acordo com Muszkat, existem muitos pesquisadores que
estudam a relação entre a música e o cérebro, e esse é outro estudo que reforça
o benefício desse contato. “Um dos motivos para que a música traga tantos
benefícios à criança é que ela trabalha múltiplas habilidades, estimulando a
parte motora, a audição, o raciocínio, as noções de proporção e ritmo, as
emoções, a sensibilidade e, assim faz com que várias áreas do cérebro funcionem
simultaneamente”, diz o especialista.
Respeite o tempo da criança
A educadora musical Teca Alencar de Brito, professora do
Departamento de Música da Escola de Comunicações e Artes da USP, afirma que é
possível introduzir a música no mundo de crianças de todas as idades, mesmo as
mais novas. Porém, é preciso respeitar seu modo de perceber o mundo. Por
exemplo, uma criança de 4 anos que quer aprender a tocar piano não
necessariamente quer aprender a ler uma partitura. Ela pode simplesmente querer
apertar as teclas e explorar as possibilidades daquele instrumento. Uma aula ou
um professor que tente diminuir esta espontaneidade provavelmente aborrecerá a
criança e a afastará do piano.
Teca reconhece os múltiplos benefícios desse contato, mas
faz uma ressalva: “Tudo depende do modo como é feito. Tem crianças que começam
a fazer aula muito cedo e não têm experiências boas. Ter contato com a música
não significa só aprender um instrumento e saber ler uma partitura. Se a aula
for chata, a criança vai se desinteressar”, explica. Ela explica que é preciso
respeitar e acompanhar o desenvolvimento da criança, e introduzir o treino mais
formal quando ela estiver mais madura.
Enquanto isso, há muitas possibilidades de trabalhar a
música, como deixar as crianças explorarem possibilidades de sonorização e
objetos, fazer música em grupo e conhecer os instrumentos. Para Muszkat, não é
preciso treinar um instrumento para desenvolver os conhecimentos musicais,
basta que a aula de música possibilite a participação ativa das crianças. E,
independente da idade, Teca defende que as aulas de música também sejam um
espaço para a criação. “O ensino da música precisa integrar essas possibilidades:
trabalhar a partitura, mas ao mesmo tempo incentivar a criança a tirar música
de ouvido, improvisar, inventar.”
Teca também não acha que a música deve ser apenas um meio
para outros fins. “Os pais não devem pensar que a música está sempre servindo a
outras coisas, eles precisam pensar na música em si e, se houver um bom
trabalho pedagógico, a criança vai se desenvolver naturalmente. Eu mesma, por
exemplo, estudo música desde os 5 anos, hoje tenho 58 e nunca fui boa em
matemática!.”
O benefício da música para crianças já foi apontado por
vários estudos e nada mais justo do que os pais quererem oferecer essa
possibilidade aos filhos desde cedo. No entanto, esse aprendizado não precisa
acontecer somente dentro dos moldes tradicionais ou de uma maneira que acabe
com toda a diversão e emoção que a música pode – e deve – proporcionar.